quinta-feira, agosto 27, 2009

O Universo Fantástico da Filosofia de Boteco



Número 19

Quarta, 09h35min

Bem, bem, bem, nenhum universozinho fantástico sobrevive sem os compañero, disse-me um amigo dos mais experientes.
Sugerindo mais intimidade do que tínhamos de fato, o safado veio com um papinho de deixe-me narrar minha história, dê cá um pouquinho de prestígio pro compañero.
O quê que há, rapaz, aqui não! De forma alguma, não senhor, a não ser que se trate da verdade mais pura e seja ainda assim interessante, quem narra aqui sou eu.

Sei que tenho arroubos de exigência, pois é árduo e desgastante ser ao mesmo tempo honesto e interessante. Mas cada um é exigente ao seu modo, pelo menos é o que dizem alguns dos grandes autores da filosofia de boteco. “Fora os que perderam qualquer padrão de exigência, seja por necessidade ou por alguma patologia mesmo”, foi o que li e vi que realmente é assim

Mudo a toada, volto dessa de divagar, pois disse ainda o amigo experiente que, bem, se eu recusasse, que Narcisão era eu então!, vê se pode, mas haja o que hajar, não sucumbo a ameaças, qual o quê. E o amigo só naquela, usando a experiência, aquele por que não?, o solidário não quer solidão, eu disse tudo bem, tudo está bom enquanto estiver bom; conte, meu filho, conte. Estamos todos em casa, pode contar, assuma o leme que vou descansar, “é com você” eu disse pra ele. “Está bem, obrigado”.

Segunda, 09h23min ou 09h25min, 3 anos antes

Uma segundona, 09h23min ou 09h25min da manhã, não me lembro bem.
_ Continue, hoje você é quem manda, falou tá falado.
_ Não vai anotar?
_ Tenho a memória boa, se houver algum buraco eu completo da minha cabeça.

Não vou contar o meu nome.
_ Por quê?
_ Naquele momento eu não lembrava, um lance de amnésia.
Não lembrava meu nome, não lembrava de nada, não sabia quem era o barrigudo na frente do espelho, quem seria?, um piri-pac brabo, brabo.

E eu naquela filosofia de não ter filosofia, ia indo, sem nome e sem nada, o que ia fazer? Fazia dias, a única cousa que eu sabia é que acordei num quarto.
_ Você disse cousa?
_ Foi o que eu disse.
_ Você disse quarto?
Acordei num quarto, ali na Santos Dummont, não muito longe da Tupis. No aposento tinha um ventilador que dava um ventinho gostoso, e tinha também um celular e um bilhete que dizia “Eldorado – o forró da sacanagem”.

Eu pouco saía do quarto, como eu pagaria aquele quarto? Na maior nóia, um rebuliço típico do centro me espantava, pela manhã eu dormia e assim eu ia, enquanto corria a barca.
_ Tudo bem, mas seja mais sucinto pra não perder o bonde; quem perde o bonde vai a pé, sabe cumé.

Quem fica bem sob pressão é um cupim bem temperado, a suã também. Vamos por partes, como diz aquele que prepara o porco para a feijoada, ou você pensa que a feijoada nasce como chega ao prato?
_ Fora os que plantam pés-de-feijoada, muito comum lá em São Judas das Botas, sei como funciona a cousa.

Conversa mole, Sujeito, deixo pra ti, compañero, mas a verdade é que eu só tinha coragem de deixar o quarto à noite, tanto que numa dessas, dei uma voltinha esperta e me deparei com um ônibus em um momento batizado como crucial por pessoas de vocabulário limitado.
_ Se quiser posso procurar um sinônimo de crucial e colocar.
_ Não precisa.
_ O que aconteceu de cruciális, decisivo, terminante?
Eu vi um ônibus. Na frente, um número qualquer e um letreiro que dizia “Eldorado”.
Mesmo sem o dinheiro da passagem, entrei. Expliquei a situação com calma e o trocador perplexo disse-me “aí no seu bilhete não está escrito Eldorado, mas, sim, El Dorado. Conheço bem: um forrozinho perto ali do Santa Inês”. E completou com um tal de você tem que pagar sua passagem.
_ A solidariedade não vive em todos os corações, quem sabe um dia... Seja mais sucinto.

Bem, bem, bem, para escapar do magic bus dei o velho golpe do envelope.
_ Que porra é essa?
Aproveitando um pequeno envelope que guardava o bilhete, eu disse bem alto “quem perdeu o envelope com o dinheiro?”, todos gritaram “fui eu, é meu, dá cá!”, já brigando entre eles, pra saber quem era o dono, pode crer?
_ E aí?
Eu respondi “acalmem-se, acalmem-se, por enquanto só encontrei o envelope, nada do dinheiro”. Dois homens e uma senhora discutiam, declaravam-se os verdadeiros donos do dinheiro. O trocador sabia que não existia dinheiro algum, mandou-me descer temendo o pior.
_ Acabou?
Escapei bonito. Nem sete minutos depois e outro momento crucial.
_ Outro?
_ O celular.
_ O celular?
Toca. Não atendo. Toca, não atendo. O medo do desconhecido.
_ Sei.
Toca de novo, alô. E vamos naquele quem é, eu é que lhe pergunto, saudade de você, ele diz, e sem saber digo “eu também”. Veja que eu senti saudade de alguém, eu nem sabia quem, porque bom é falar com algum conhecido.
_ Um ilustre conhecido desconhecido?
_ É.
E ele falou “que loucura foi aquele dia, vamos combinar outro desses”, com menos vodka e menos gelo, por favor, que minha garganta foi nocauteada, respondi fingido que só, porque lembrar eu não lembrava.
Do outro lado, o conhecido continuou falando ao telefone. “Da próxima te acompanho no Forró do El Dorado, soube que você aprontou barbaridades por lá, depois me conte direito essa história, compañero.” Pode deixar que conto sim, claro, eu respondi.

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Texto: Alexander Reis
Ilustrações: Pablo Leandro

sexta-feira, agosto 14, 2009

O Universo Fantástico da Filosofia de Boteco ­­­


Número 18

Um daqueles dias, qualquer um, um dia comum dos mais iguais que já vi. Em 82,5% dos dias vivemos entediados pelo cotidiano e a rotina, segundo pesquisa de uma universidade inglesa que acabei de inventar. Mas o número é alarmante. Segundo a mesma universidade, o que resta é passar o tempo conversando, haja assunto.

Segunda-feira, 13h02min

Agora, na falta de assunto, reparem depois, para não dizer que estou inventando, não falta nunca um filósofo a improvisar, ou, para ser exato, um improvisado a filosofar.
_ Exatamente! – ele diz.
_ Eu só estava pensando alto.
_ Ah, por isso então, deve ser, um cheiro estranho no ar...

Bicho-do-mato, ele mesmo, quem mais poderia?, desgraçadamente infame, Macunaíma da periferia, mas cotidianamente meu amigo.
_ Estou escutando.
_ Desculpe, só estava pensando alto, tanto que o elogiei.
_ E dizer que sou seu amigo é elogio?
_ Na ausência de um elogio melhor...
_ Garçom, vê pra nóis dois Kaol, será que Kaol eu digo no plural?, não faz mal, vê também aí uma cerveja, que antes do almoço é muito bom, pra ficar pensando melhor.
_ Mal me faz é um cochilo depois do almoço. Ovo dá pesadelo.
_ O segredo é peidar todo o ovo antes de dormir!
_ É?
_ Mas, Sujeito, que irônico, olhe só, estudei a vida toda e a vida inteira em uma escola plural e até hoje passo mal com os plural, foda.
_ Treine colocar um s depois do Kaol; “é isso”.

Na carência de uma conversa razoável, lembro que Kaol, o nome, não surgiu do nada: é k de cachaça, a de arroz, o de ovo, l de linguiça. Infelizmente o torresmo, a farofa e a couve não couberam no nome.

_ Mas cabem no meu prato, Deus abençoe o Café Palhares, desde 1938, por isso.
_ Eu só estava pensando alto.
_ Senti um cheiro mesmo, mas veja só, Sujeito, que irônico, futebol é mesmo um universo fantástico à parte, o mundo fora dos mundos, bem melhor que qualquer filosofia abilolada.
_ Na falta de assunto, só se for.
_ Olhe só, o quê que é isso!, quem diria o quê disso?, Sarney, Lula e Collor, no mesmo time, beijando o escudo, matando no peito e tocando a redonda. Se antigamente não era só pernada, era cotovelada, carrinho por trás; sabe, pra mim, acabou o amor à camisa.
_ Ali são todos profissionais, pais de família. Só que a janela de transferências está aberta nessa época.
_ Nessa?
_ É o que dizem, mas no futebol não tem rotina.

_ O grupo tava desacreditado, agora tá unido, com humildade, o esquema definido, atenção na bola parada, respeitando o adversário, mas aproveitando as oportunidades... chegou!, ó os Kaols!
_ Bom apetite – e começo a mastigar sempre pelo torresmo. Hábito.

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Texto: Alexander Reis

Ilustrações: Pablo Leandro

terça-feira, agosto 04, 2009

Curtas 5


Senado

Muito se discute sobre nosso Senado, PMDB, atos secretos, opinião pública caindo de pau. Mas, o que me parece intrigante nesta história toda ninguém fala: Por acaso alguém já viu o Sarney sem bigode?

Complô

Depois da gripe aviária e da vaca louca, a gripe suína. Teimo em dizer que os vegetarianos juntamente com o greenpeace estão querendo dominar o mundo. Mas para garantir uma picanha maturada entro nesta guerra sem pestanejar.

Inverno

Se não chover em Belo Horizonte nos próximos dias podem acabar com nossas subidas e esquinas e trazer pra cá o Congresso Nacional. Pra virar Brasília falta pouco. Nosso governador já pensando nesta secura do tempo encomendou da Colômbia um nariz platinado novinho, dizem as más línguas. Vai se saber por que...

Livro e filme

Li nestas férias Budapeste do inenarrável Chico Buarque e agora estou morrendo de medo de ver o filme e achar una mierda, como normalmente acontece. O livro vale muito a pena. Recomendo.

Livro e filme II

E vão colocar na tela duas produções baseadas nas obras de Paulo Coelho. Ai ai... Neste caso a premissa acima muda completamente de sentido. Ambos devem ser ruins de doer.

Filme e livro

Depois de muitos alunos falarem pra eu ver, decidi aventurar num tipo de película que nunca me agradou. Peguei o tal de Crepúsculo e perdi 1 h e 40 min da minha vida. Tudo bem que é para adolescentes, mas, adoro desenhos e garanto que mesmo sendo para crianças são muito melhores do que este. Nem penso em chegar perto do livro.

Música

Ouvindo muito o CD que ganhei ano passado do compositor e cantor carioca Edu Krieger. Depois que vi a entrevista dele na Globo News, passei a dedicar mais atenção. Valendo a pena. E ele lança disco novo em setembro. Fico na espera.

Música II

Assisti também a cantora Aline Calixto no programa do Jô. Ótimo saber que os músicos daqui de BH estão aparecendo em rede nacional, pero, a entrevista deixou muitoooo a desejar, não pela Aline, mas sim pelo entrevistador, de quem nunca fui fã, deveras. David Letterman piorado. O disco dela? Gostei bastante. Podem conferir clicando aqui! Muita sorte para todos eles.

E vou ficando por aqui, mas esta semana reapareço com texto novo ok?

Abraços!!